
O prodígio Jean-Michel Basquiat foi fundamental para a arte contemporânea. O afrodescendente americano nascido no Brooklyn, filho de porto-riquenha e haitiano, teve vida curta – apenas vinte e sete anos, entre 1960 e 1988. Uma biografia marcada na infância por um atropelamento e, desde então, pela revelação de seu talento, pela fama e amigos-celebridades (tantas que se transformou numa delas), por um comportamento irrequieto e muitas drogas, que culminaram na overdose fatal. Foi imprescindível para o mundo das artes, pois foi um apaixonado desde criança pelo desenho sempre transgressor, como ele. Para o fenômeno Jean-Michel Basquiat, Marcelo Rosenbaum, a convite de Casa Vogue, criou um loft carregado de veneno antimonotonia. Instalado no antigo galpão industrial de uma gráfica, coincidentemente nos domínios do próprio escritório de Rosenbaum, em Pinheiros, São Paulo, o lugar revive na íntegra – física e conceitualmente – o clima da década de 1980, os verdadeiros anos loucos nova-iorquinos, quando os artistas então ocuparam esses espaços no SoHo, em função de seus baixos aluguéis, para ali instalarem seus estúdios-moradia. “Tivemos sinergia total com o trabalho e propusemos uma solução de liberdade quase estudantil: inspirada por Basquiat, mas que a gente também sempre teve”, diz um jovem Marcelo sem sombra de pretensão, apesar de também famoso em seu país, aos quarenta anos, com vinte e um dedicados a tudo que é pop (inclusive o rádio e a TV, onde se pode ouvi-lo em spots de dicas, e assisti-lo em extreme makeovers).>
Em linguagem densa, repleta de informação por todos os lados – e denúncia social sempre -, porém até divertida, colorida, como a obra, e elaborada como o personagem a quem se destina, Marcelo e seus designers reuniram, em um só grande ambiente, o estilo desse menino, de classe média alta que se transformou em músico, grafiteiro e pintor. Um artista plástico que usou desde o desenho a lápis, caneta e pastel, a colagem, a aquarela, serigrafia, a pintura com tinta, spray e sangue. “E que quis comprar tudo quando ficou rico, só para se autoafirmar”, diz Rosenbaum. Do início, quando vendia cartões-postais e camisetas na rua, e grafitava com seu amigo Al Diaz nas fachadas de Manhattan a marca que tornaram famosa (SAMO, que queria dizer “same old shit”), à amizade com o mito de época Andy Warhol, cuja Factory freqüentou, e ao namoro com Madonna, então em começo de carreira também, Basquiat sempre demonstrou sofisticação, até mesmo em sua linguagem escrita na arte, bom leitor que foi em espanhol, inglês e francês. Rosenbaum reuniu seu universo nesse ambiente integrado – pela adequação, beleza, “ou jeito”, obras de arte brasileiras, além de móveis e objetos étnicos ou de design nacional e internacional que, segundo ele, refletem esse espírito. Daí as peças africanas (as máscaras sempre foram sua marca, além das caveiras), os grafites em geral, as coroas estilizadas que eram sua referência (no caso, literalmente real, tanto nas peças em si quanto em uma representação simplificada e impressa em todo lugar). Assim como o c, símbolo de copyright.>
As luvas de boxe penduradas na porta do armário japonês e luxuoso, em madeira e com puxadores delicadíssimos esculpidos em flores de marfim, refletem esse “luxo ordinário”, explica Rosenbaum. É a transformação pelo uso, pela mistura, sem ostentação. De um tempo heróico (de heroína?) em que muitas estrelas viveram a NY da loucura. Mas nossa maluquete da vez é a top Isabella Melo, produzida por verena Bonzo, com beauty by Evandro Ângelo. Em jeans rasgados, camisa branca NK e cabelão absolutely 80´s, ensaiando caras e bocas para as lentes de Romulo Fialdini, encarou o melhor clima “fui visitar Basquiat e deixei minha marca”. Rosenbaum também contou com um time nessa empreitada: a colaboração de Adriana Benguela, Ana Galli, Rodrigo Vieira, Henrique Pinheiro – além das galerias Choque Cultural e Pontes e diversos artistas plásticos como Sandro Akel, Bruno Dias, Brunno Jahara e Gui Mohallem.
Se tantos heróis dos 80’s tiveram no prazer um risco de vida, e morreram ainda muito jovens de Aids ou overdose (como Jimmy Hendrix, Jim Morrison e Janis Joplin), a marca indelével de mias um, Jean-Michel Basquiat, ficou para sempre. E, mesmo sem uma grande ideologia (será que ele precisa de um para viver?), mas cheio de um poder artístico incontestável, serviu muito à criação mundial – de lá pra cá, e para sempre, Ou não estaríamos vivendo, mais de vinte anos depois, uma explosão de cores e formas de arte, com direito aos grafites invadindo, de maneira alegre e ao mesmo tempo contestatória, as próprias galerias e as nossas casas. Salve Basquiat!