Arquivo do mês: maio 2009

casas de são paulo: uma carta de amor

livro

uma carta de amor

Encaixada entre duas paredes de pedra de arrimo e quatro araucárias ela surgiu, quase escondida em meio à natureza de um terreno em declive, todos os andares rodeados pela mata e tendo como centro e a uni-los uma bela e sinuosa escada em caracol – depois da porta de entrada amarela, no topo, é ela que faz as honras da casa. Como que solta dentro de uma caixa de travertino itliano, com corrimão que é parte da estrutura, ensolarada sobre claraboias que permitem à luz alcançar todos os andares e partindo do alto do terreno até o terraço embaixo que é saída para o jardim, ela é a grande vedete desta casa de fim de semana em Campos do Jordão.

Foi um projeto-marco ou da maturidade, na vida de Marcelo Rosenbaum, conhecido arquiteto e designer de 40 anos que já virou grife “pop” de produtos industralizados com inspiração no artesanato popular brasileiro. Além de ter em programa na TV o quadro Lar Doce Lar, com audiência de 21 pontos no Ibope, onde reforma, com o intuito de aumentar a autoestima dos donos, a moradia de pessoas menos abastadas, é autor de casas, apartamentos, lojas e restaurantes badalados da cidade.

Marcelo, de mãe católica mas que, desde a infância, via o pai, Rubens Rosenbaum, advogado de origem alemã e judaica, fazendo as vezes de arquiteto, reformando casas para si e para vender, jamias acreditou que um dia haveria de projetar para o pai e, muito menos, que este fosse lhe dar carta-branca. Pois foi o que aconteceu, quando Marcelo lhe propôs que demolisse a casa existente no terreno, mal posicionada, úmida e onde o sol não entrava, e partisse para algo mais condizente com o entorno. Se alguma exigência houve, foi que a casa fosse generosa, com espaço também para os quatro filhos do casal, todos por sua vez casados e com filhos. E, depois de três anos de obras, de assistir ao pai contente e entusiasmado tercer-lhe elogios, ganhou forma este projeto, que Marcelo considera uma carta de amor ao pai.

Nada na construção deixou de ser cuidadosamente pensado, como o contraste entre o travertino polido da lareira dentro e fora da churrasqueira e a pedra goiana bem bruta das paredes, que parece ter ali sido encontrada. Além das madeiras, sempre de demolição ou certificadas, tratadas ou deixadas em estado natural. Ou é perobinha-do-campo, ou pínus, ou pinho-de-riga, ou as longas e cinzas cruzetas de postes antigos. Aparecem nas venezianas das janelas tais quais biombos que depois se fecham formando um só painel grande, ou em portas internas e altas do chão ao teto, marcos, degraus da escada, deck, onde os dormentes se transformam, nas extremidades, em longos bancos que se fundem à paisagem.

No andar central, os quadros têm idêntica visão da floresta e cada um cor diferente no teto, que pode ser o azul de um céu adormecendo ou tons do outono, terrosos e alaranjados.

Mostrar que a boa arquitetura e o bom design fazem diferença na vida das pessoas é crença que sempre lhe pautou o trabalho. Aqui, nesta casa escondida atrás da natureza e onde várias gerações se reúnem com prazer, conseguiu o que talvez mais desejasse na vida – ser reconhecido e admirado pelo pai.

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texto Maria Ignez Barbosa
fotografia Tuca Reinés
São Paulo, 2009
Metalivros

 

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boa ciranda para o dança vida

Para quem ainda não conhece, o Dança Vida é o grupo de dança dirigido pela psicóloga, dançarina e coreógrafa Paula Vital. Como se fosse pouco, o trabalho da Paula é muito maior. Há 15 anos atrás, ainda estudante, ela começou literalmente na rua: estacionava seu carro em comunidades carentes de Ribeirão Preto, colocava som na caixa e em meia hora estava rodeada de crianças acompanhando seus movimentos, improvisando coreografias. Ela fez da dança seu  instrumento de trabalho pela inclusão social. E de lá pra cá, é o que melhor tem feito por milhares de jovens que já foram beneficiados, entre tantos que se tornaram multiplicadoras do programa, e desde 2007 com o estabelecimento da Cia. Experimental Dança Vida.

Em 2006, fizemos o cenário do espetáculo Corpos de Luz que foi apresentado aqui em São Paulo, no Centro de Cultura Judaica, inspirado no livro A Terra de Mil Povos de Kaká Werá, com trilha composta por Naná Vasconcelos. Foi mesmo show! Estávamos diante de um trabalho profissional em todos os aspectos, principalmente pelos bailarinos livres, leves e soltos do estigma de jovens de risco social. A verdadeira inclusão já havia cumprido seu papel e virado esta página em suas vidas.

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Continuamos mais amigos e apoiadores do Dança Vida. Em 2007, doamos todos os móveis que criamos para a Casa Cor para a companhia, imaginando que a renda da venda pudesse ser revertida e desse um impulso importante especialmente no projeto de construção da sede própria. Organizamos um leilão e não tivemos grande sucesso.

Semana passada, o Marcelo foi a Ribeirão assitir ao novo espetáculo e tivemos mais uma tentativa fracassada de angariar fundos através da venda dos móveis. Só que a ciranda virou à nosso favor: não vendemos os móveis, ficou evidente que seria muito mais eficaz divulgar a Cia. em Ribeirão mesmo, e por contatos feitos lá, no  próprio dia da venda frustrada dos móveis, o núcleo de Ribeirão Preto da Associação Brasileira dos Decoradores  junto com a Inês Aquino (proprietária da Loja Design Brasil) propuseram criar um projeto para a sede, a ser apresentado para a Secretaria Municipal de Cultura de Ribeirão Preto que já demonstrou a intenção de  instalar num  prédio tombado da cidade. Final feliz: os móveis cumpriram sua função e com certeza o lugar deles será decorando a nova sede!

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(… por causa do Corpos de Luz, conhecemos o Kaká Werá, que tonou-se amigo e parceiro de trabalho, que fez o Dalva e Dito com a gente e que está no projeto da nova loja da Micasa…., mas isso já são outras cirandas das cirandas!…)

notícias: gazeta mercantil

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Gazeta Mercantil – Plano Pessoal | 19/05 – 00:57

Memória afetiva, resgate e auto-estima

São Paulo, 19 de Maio de 2009 –

Todo ano era sagrado. Quando chegavam as férias de julho, a família Rosenbaum entrava no carro e viajava em direção ao sul do Brasil, mais especificamente para as cidades de Joinville e Blumenau. “Naquela época eu apenas curtia, mas hoje eu entendo que meu pai queria resgatar suas origens alemãs. Era uma viagem emocional”, diz Marcelo Rosenbaum. Durante a aventura, eles aproveitavam para abastecer a casa com produtos comprados em Foz do Iguaçu, por exemplo. “A família inteira se envolvia na compra de um tapete ou de uma estátua”, diz.
Rosenbaum nasceu em Santo André, na Grande São Paulo, em uma família de classe média com “algum acesso”. Mas fazia questão de frequentar a piscina pública da cidade, onde tinha muitos amigos. Um deles, o Sombra, era seu companheiro inseparável. Um dia, foram convidados a participar de uma competição no Clube Harmonia, clube da classe alta paulistana e o amigo foi barrado na porta por ser negro. “Eu também não entrei, em solidariedade a ele, e não entendia como alguém podia barrar a entrada de alguém em um clube por ser negro”, diz.


Esse é o universo de Marcelo Rosenbaum. O arquiteto, decorador e designer fez do resgaste da brasilidade e da inclusão social a marca registrada de seu trabalho. É fácil identificar em seus projetos a razão de seu sucesso. Ele não tem preconceito. Para decorar a cozinha de uma das edições da Casa Cor, escolheu cadeiras de plástico espaguete, daquelas que ainda se vê nas varandas de cidades do interior. Crochê, estátua de barro, móveis retrô, santos, bancos caipiras, fotografias, manto de maracatu: ele mistura tudo e entrega. Mas com uma condição. De que tudo tenha autenticidade.
Mesmo que ainda seja procurado para projetar ambientes de luxo, como o restaurante Dalva e Dito, de Alex Atala, Rosenbaum sente-se cada mais seduzido em atender as classes C e D. “Eles entendem o que eu falo”, diz. O profissional está cada vez mais envolvido com essa turma. Depois de virar celebridade nacional ao aceitar o convite de Luciano Huck para apresentar o programa “Lar Doce Lar“, exibido aos sábados na Rede Globo, onde reforma e entrega casas e apartamentos decorados, ele fala aos ouvintes da Rádio Globo diariamente sobre assuntos ligados a seu universo. Faz palestras para os índios no Amazonas e para funcionários da Infraero. Está envolvido na capacitação dos desabrigados das enchentes de Blumenau para que eles, com patrocínio da Suvinil, possam pintar seus abrigos e descubram alguma vontade de recomeçar a vida em um lugar mais colorido. Também acaba de lançar uma nova marca, a Rosenbaum de Coração, que está se empenhando, junto com a empresa de licenciamentos Redibra, para conseguir parceiros com o intuito de expandir a sua criatividade (estampas para cadernos, papéis de parede etc). Foi do seu escritório no bairro de Pinheiros, que Rosenbaum falou à Gazeta Mercantil. Cercado pelos objetos que colecionou a vida inteira, ele explica porque o seu trabalho tem tanta repercussão entre as classes menos abastadas.

Gazeta Mercantil – O que você fazia quando era adolescente?Eu estudava em colégio particular e passava a maior parte do meu dia na piscina pública. Meu melhor amigo, Sombra, era negro. Ele morava em uma casa precária. Nessa época, viemos para São Paulo competir no clube Harmonia e ele não pôde entrar porque era negro. Eu não sabia que isso podia existir. Foi um choque. Fiquei do lado de fora do clube. Se ele não podia entrar, eu também não iria entrar.

Gazeta Mercantil – Gazeta Mercantil – Mas quando você começou a trabalhar?Com dezessete anos eu fazia reforma e decoração de loja e cursava arquitetura. A mãe de uma namorada da época comprou um box para vender roupa e eu pedi para fazer. Eu mesmo construí a loja. E sempre deu muito certo desde o começo.

Gazeta Mercantil – E depois? Eu não terminei a faculdade de arquitetura porque fui para Alemanha trabalhar em um escritório de design, em 1993. Fiquei em Munique. Fui depois para Berlim no ano seguinte. Voltei e comecei a fazer objetos com design. Sempre quis trazer humanidade para marcas. Aprofundei-me nisso.

Gazeta Mercantil – O que acha de designers que criam sob encomenda? Tem que ser assim. Essa questão é muito interessante porque o Brasil tem um parque industrial muito grande e rico. Mas ele nunca foi focado para o mercado interno e para a inovação. O parque moveleiro cresceu com uma tecnologia surpreendente, com preço competitivo, com projetos estrangeiros e duvidosos. Sempre para a massa. No mundo inteiro, não dá para dizer que o design popular teve uma atenção especial. Eles cresceram, mas sem design, só fazendo cópia. Hoje, com as políticas monetárias, esse parque começou a querer entender o mercado interno e trazer novidade. Só que essa cultura não existia.

Gazeta Mercantil – Não existia visão? Se não há design, porque há a necessidade de profissionalizar o mercado, criar uma faculdade? Não há motivo. Tudo é muito novo no país. Ainda mais agora que o mundo está em crise. Agora não existe mais opção. O mundo olha para o mercado interno. O design brasileiro está borbulhando.

Gazeta Mercantil – Fale um pouco da sua experiência na loja Teto. A Teto foi um case fantástico. Eu fiquei dois anos na loja. Montei o conceito e os produtos. Criamos, eu e meu sócio na época Sérgio Fix, uma marca com identidade, eventos que interligavam a moda, a arte, a música e o mobiliário no mesmo espaço. Era uma loja guerrilha. Em um sábado. a gente vendia tudo, apareciam cerca de 700 pessoas. O mundo assim é hoje, tudo interligado.

Gazeta Mercantil – Você fala com vários públicos. Clientes particulares, empresas, o público que te assiste na TV e te ouve no rádio. Eu volto para a experiência da natação. Eu ficava com meu amigo Sombra e com a elite do ABC. Isso é natural para mim. Quanto mais eu falo que quero trabalhar para as classes C e D, mais a elite me procura. O meu desejo é fazer a Rosenbaum de Coração vingar em larga escala, mas eu não vou largar a minha identidade.

Gazeta Mercantil – Quando a elite te contrata, o que ela quer? O meu pensamento. É muito legal o que está acontecendo. Somos procurados pelo que somos. Eu trabalho a humanidade, a brasilidade, a memória dos espaços, a inclusão. Eu viajo muito pelo Brasil, dou palestras.


Gazeta Mercantil – Sobre o que você fala?
Empresas como o Sebrae, Suvinil, Bosch, Black & Decker e até faculdades me chamam. Eu apresento o meu processo de pensamento. Não explico se azul combina com rosa. Eu mostro que o importante é o gosto. Falei com a Infraero no ano passado para uma platéia de 1.200 pessoas. Foi uma experiência fantástica. Estavam lá o presidente e a funcionária mais simples. Todo mundo ficou quieto. Eu fiquei arrepiado. Esse público me entende, eles percebem que eu falo de auto-estima. Eu falo que me inspiro no maracatu, que pego móvel no lixo para usar na Casa Cor.


Gazeta Mercantil – Como é a casa dos seus pais? Já fez intervenções lá?
Ah, eu já reformei várias casas da minha família… Meus pais sempre tiveram muita noção de estética, aprendi muito com eles, eles curtem muito a casa. Fazíamos muitas viagens para o sul do País – meu pai é alemão. Íamos para Joinville e Blumenau, mas antes a gente passava em Foz do Iguaçu para comprar tapete, estátua. Era uma aventura. A gente ficava horas escolhendo o tapete para a sala. E ao mesmo tempo, ir para lá era a forma do meu pai resgatar a família. Era a colcha de retalhos deles.


Gazeta Mercantil – O que é a Rosenbaum de Coração?
O primeiro produto dessa empresa é o programa de rádio, Decoração pra você, na rádio Globo AM. Começamos em dezembro. Impactei 32 milhões de pessoas desde então. Tem o blog também, são cinco mil pessoas que visitam (www.rosenbaum.com.br). A idéia é abrir o espectro e atingir cada vez mais pessoas.
(Gazeta Mercantil/Caderno D – Pág. 4)

(Cinthia Rodrigues)

abrigos em blumenau, coloridos(!)

De acordo com a Defesa Civil da Cidade de Blumenau, a catástrofe ocorrida em novembro de 2008 deixou 25 mil pessoas desalojadas que abrigaram-se em casas de parentes ou vizinhos e 5.209 pessoas que perderam suas casas e, em muitos casos, até os terrenos. Hoje a cidade conta com 6 abrigos temporários, um montado numa escola desativada e os outros cinco em galpões industriais alugados. Nesses galpões foram criados módulos de 5 X 5m, em madeira, e cada família pode ocupar 1, 2 ou 3 módulos de acordo com o número de pessoas. A cozinha, área de serviço e banheiros são comunitários. Em alguns chegam a  morar  até 100 famílias. No total, hoje são 359 famílias, em torno de  1.600 pessoas.

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O Marcelo esteve em Blumenau na primeira semana após o acontecido e desde então estamos empenhados em mobilizar parcerias pela causa. A sensação que fica, pra gente e mesmo para as  próprias vítimas, é que a desgraça é tanta que só resta arregaçar as mangas e trabalhar para reconstruir não só as moradias, mas a autoestima dessas milhares de pessoas.

A boa notícia é que está fechada a parceria com a Suvinil – nossa parceira de outros projetos. Além de doar as tintas para a pintura de todos os abrigos, a empresa oferecerá um curso de capacitação de pintores, com aulas técnicas e práticas, para que os próprios moradores possam pintar os abrigos e ganhem qualificação profissional para seguir trabalhando.

No dia 8 de maio, foi feita uma visita aos abrigos, acompanhada pelo grupo de assistentes sociais envolvidos, pessoal da Suvinil e o Marcelo, para avaliação das áreas que serão pintadas. O processo de triagem para a oficina de capacitação está em andamento. Os futuros novos pintores serão credenciados nas lojas que vendem Suvinil e poderão ser indicados como profissionais para novos trabalhos. A entrega dos certificados será feita pelo Marcelo, num encontro de confraternização entre as comunidades dos abrigos. E no dia seguinte, ele fará um workshop com os pintores formados, para que juntos planejem a pintura, escolham as cores e criem a paleta das Novas Cores de Blumenau.

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A nossa ideia é, além da benfeitoria na estrutura, trazer alegria, mais dignidade, mais conforto e identidade para estas pessoas que ainda não têm sequer previsão de saída dos abrigos. Hoje a casa delas é lá. Vamos contando…

Fotos: Patricia Schwanke

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